domingo, fevereiro 14, 2010


Estava deitada na cadeira do meu jardim quando me levaram para longe de casa.
Olhos adormecidos e cabeça fechada lá fui eu sem dar por nada.
Dizem que no caminho tossi muito e toda a gente se afastou.
E eu lembro-me de te ver, fazias-me mal. Muito mal. Estavas num divã e dominavas, sério de tanto prazer e delirado por eu estar a ver. E eu não respirava. Olhava de fora como se de um filme pornográfico se tratasse, completamente estarrecida com a certeza deste actor não estar a ser pago e ser muito mais bem servido.
Saíste de cima dela e vieste ao meu encontro. Gritei mais do que consegui fugir, chamei-te os nomes que me lembrei que detestavas e escrevi no guião o desaparecimento total da minha personagem.
Mais do que não te querer ver, sabia que jamais me poderias voltar a tocar. E não era por desconhecer que todos somos capazes de seguir vontades intrínsecas com seres extrínsecos. Era por me teres obrigado a assistir à tal união desconhecida de um ser tão meu conhecido.
Podia perfeitamente estar eu ali no teu lugar, satisfazendo-me com outro objecto humano mas nunca faria questão de to mostrar porque eu antecedo sempre cada pormenor teu. Mas tu, burro de todo o tamanho, nem pensaste no após e muito menos em nós.
E durante toda esta imagem eu não respirei.
Ouvi-te chorar ao longe como um pai que assiste ao parto do filho já morto, que julgava ver vivo.
Eu tinha morrido sem saber o motivo e ninguém conhecia este argumento que dentro de mim ecoava e que nunca tinha nem teria acontecido.
E tu estavas agora deitado no chão, onde dormiste comigo o primeiro sono da minha morte, pregado aos tacos com furos no coração.

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